Sobrevivendo ao Desânimo
- Pastor Sérgio Fernandes
- 16 de mai. de 2021
- 7 min de leitura

João 16:33 – “Eu disse essas coisas para que em mim vocês tenham paz. Neste mundo vocês terão aflições; contudo, tenham ânimo! Eu venci o mundo”.
Introdução
Uma das maiores marcas que nossos dias tem deixado em cristãos do mundo todo é uma profunda onda de desânimo espiritual. Sinto uma profunda tristeza em ver a quantidade de pessoas que afirmavam ser crentes em Cristo e que hoje estão dentro de suas casas, vivendo como se o Salvador não existisse. Embora tenha consciência de que a profissão de fé da maior parte dos evangélicos brasileiros é deficitária e a maior parte deles mal consegue conceituar biblicamente o que é a salvação, essa é uma realidade que precisamos combater para sobreviver. Sim, precisamos sobreviver ao desânimo.
Nessa reflexão, o desejo do meu coração é pontuar com vocês o que é o desânimo, como ele surge em nossas vidas e o que precisamos fazer para vencê-lo e prosseguir nossa caminhada até a Canaã Celestial. E vou exemplificar esse ensinamento acompanhando com vocês a história dos dois discípulos no caminho de Emaús. Espero sinceramente que o Senhor fale ao seu coração!
o que é o desânimo?
O desânimo é um abatimento que enfrentamos diante de situações que nos amedrontam ou nos desgatam emocionalmente. Uma vez instalado em nosso coração, ele nos leva a desacreditarmos de nossa fé, das possibilidades que temos de crescermos e frutificarmos diante do Senhor. Em ocasiões em que ele se mostra persistente, ele nos leva a abandonarmos projetos pessoais, ministérios, vocações, conduzindo-nos a uma condição de fracasso e apatia.
Biblicamente, o desânimo é a condição daqueles que perderam sua confiança em Deus e se vêem mergulhados em um profundo mar de frustrações e inquietações. O primeiro personagem da Escritura a sentir-se desanimado foi Abraão (Gn 15.1-3), que não aguentava passar a prova de tempo até que a promessa referente ao nascimento de Isaque se cumprisse. Jó enfrentou um desânimo profundo ao ter que lidar com a perca dos filhos e de suas propriedades (Jó 10.1). Elias se viu desanimado ao sentir-se sozinho na defesa da fé diante das atrocidades de Jezabel (1 Rs 19.4). Diversos outros personagens sentiram na pele o que é desanimar e isso deve nos conduzir naturalmente a duas reflexões.
A primeira, todo crente, por mais virtuoso que seja, está passível de desanimar vez ou outra. Não devemos tratar o fato de nos encontrarmos pontualmente desanimados como o fim do mundo ou da carreira espiritual. Levar a pesada cruz do discipulado nos ombros causa um desgaste natural, por isso, ao nos convidar a obedecermos o mandamento de congregarmos regularmente (Hb 10.25), Deus está nos dando um remédio eficaz para evitarmos o desânimo persistente, porque a fé vem pelo ouvir, e ouvir a Palavra de Deus (Rm 10.17).
A segunda, embora o desânimo possa chegar a nos atingir, ele deve ser tratado por nós com severidade, porque a Escritura afirma que sem fé, é impossivel agradar a Deus (Hb 11.6). A desesperança que naturalmente acompanha esse esmorecimento dificultará nossa percepção da graça de Deus e isso, paulatinamente, afrouxará nossas convicções e valores. O desânimo persistente, que se configura como uma forma de incredulidade, deve ser tratado com pecado, que exige de nós arrependimento e mudança de coração.
dois discípulos no caminho de emaús
No dia em que Jesus ressuscitou, dois dos seus discípulos estavam de caminho para uma aldeia chamada Emaús, que era localizada há cerca de dez quilômetros de Jerusalém. Ambos estavam profundamente impactados com os fatos que haviam se sucedido (a morte cruenta de Cristo na cruz) e entristecidos porque a esperança que haviam criado a respeito da obra do Messias havia se frustrado (Lc 24.13-17).
A primeira coisa que percebo aqui é o quanto o desânimo é contagioso e como os desanimados precisam desanimar mais alguém para se sentirem melhor. Ambos os discípulos estavam compartilhando suas frustrações, não para se ajudarem, porque o texto deixa claro que eles estavam entristecidos (vv.17).
A segunda coisa que percebo é o tratamento especial que Cristo dedica a quem está desanimado. Podemos imaginar que o desanimado está sozinho, mas a Escritura nos mostra que Deus sente prazer em levantar o caído e aqui não foi diferente: enquanto eles conversavam e discutiam, o próprio Cristo foi até eles e lhes perguntou: "o que é isso que vos preocupa à medida que vocês caminham?" (vv.17). Apesar do desânimo poder se configurar como um estado pecaminoso, Jesus não abandona o desanimado. Aleluia!
A terceira coisa que o texto deixa claro é que o desanimado sempre tem desculpas para a sua situação. Ao serem questionados por Jesus a respeito da suas tristezas, um deles respondeu que estavam daquela maneira pelos fatos que haviam acontecido com Jesus (até o momento, eles não o haviam reconhecido). Eles esperavam que Jesus fosse o libertador político de Israel (o que nunca foi o plano divino) e ao perceberem essa expectativa falhou, optaram por mergulhar novamente no profundo mar da desilução. É, realmente os discípulos as vezes não sabem lidar com os caminhos profundos do Senhor.
A quarta coisa que observo é que havia uma frustração em ambos porque alguns haviam alegado ter visto o Cristo ressuscitado, mas eles ainda não haviam visto (e estavam diante dEle, sem o perceber). Uma das fontes geradoras do desânimo é quando pensamos que Cristo está fazendo mais pelo nosso irmão do que pela gente. Quando não entendemos o evangelho da graça, pensamos que Deus é alguém que existe para nos satisfazer quando precisamos dEle. Contudo, ao sermos iluminados pelo Espírito e vermos o tamanho da nossa depravação espiritual, somos encorajados a perceber que o perdão dos pecados e a justificação são provas suficientes da bondade de Deus para conosco. Um crente que tem consciência dos seus pecados e do perdão que recebeu é capaz de se "alegrar com os que se alegram", sem perder seu ânimo espiritual.
AS LIÇÕES do texto PARA SOBREVIVERMOS AO DESÂNIMO
Jesus ama restaurar ao desanimado, mas trata o desânimo com a severidade que ele merece. As palavras de Cristo são surpreendentes e fortes:
Então ele lhes disse: — Como vocês são insensatos e demoram para crer em tudo o que os profetas disseram! Lucas 24:25
A primeira coisa que aqueles discípulos deveriam fazer era, nas palavras de Cristo, crer no que a Escritura estava dizendo. Se quisermos sobreviver as ondas de desânimo que tentam nos afogar, precisamos retornar ao lugar de onde flui a voz do Espírito: a palavra escrita que nos foi revelada e deixada, a Bíblia.
E, assim, a fé vem pelo ouvir, e o ouvir, pela palavra de Cristo. Romanos 10:17
A segunda coisa que Jesus fez foi mostrar por toda a Escritura revelada até aquele momento (o Antigo Testamento) o que dele estava escrito. Imaginem que gostoso deve ter sido participar de uma aula de Escola de Discípulos com Jesus como professor? Havia um propósito pedagógico nisso: somos tentados a ler a Bíblia para descobrirmos o que ela tem a dizer a nosso respeito. Mas Jesus nos mostra com esse gesto que devemos ler a Bíblia para compreender o que ela diz a respeito dEle. Quanto mais conhecermos a Cristo e mais nos saciarmos nas límpidas fontes da salvação, mais fortalecidos seremos para enfrentarmos a nós mesmos, ao mundo e às trevas que nos cercam. Todo o universo gira em torno de Cristo e de sua obra de salvação.
E, começando por Moisés e todos os Profetas, explicou-lhes o que constava a respeito dele em todas as Escrituras. Lucas 24:27
A terceira coisa maravilhosa a ser observada no texto foi a mudança de atitude dos discípulos. Lembra que falei que o desânimo é contagioso? A fé é muito mais! Após algum tempo de conversa com Jesus, o coração deles ficou aquecido a ponto deles não quererem mais ficar sozinhos. Eles precisavam continuar ouvindo aquelas palavras de vida eterna, que lhes fizeram enxergar que mesmo na tragédia da cruz, o Deus soberano estava cumprindo de modo cabal seu plano de levar pecadores ao arrependimento e atrair seus eleitos a fé pessoal em Jesus Cristo. Se quisermos vencer o desânimo, precisamos estar perto de pessoas animadas. Observe os desanimados da igreja e perceba duas coisas: ou eles preferem ficar à parte do que Deus está fazendo na comunidade ou eles se juntam a gente desanimada como eles. E olhe para aqueles que tem dado frutos abundantes para o Reino, eles sempre estão ladeados de pessoas cheias de fé. Ande com pessoas cheias de fé e a sua incredulidade será vencida.
Mas eles o convenceram a ficar, dizendo: — Fique conosco, porque é tarde, e o dia já está chegando ao fim. E entrou para ficar com eles. Lucas 24:29
Por fim, a lembrança dos sofrimentos do Messias lhes trouxeram ânimo para continuar. Quando entraram para o repouso e foram fazer a refeição, Jesus tomou o pão e o partiu diante deles. Esse gesto era um costume judaico de dar graças pela refeição. No ato, o hospedeiro (que não era o caso de Jesus, que era o hóspede) levantava ao céu o pão,,, o partia, e agradecia a Deus. Certamente, ao levantar suas mãos em oração, as feridas dos cravos ficaram evidentes; aquelas marcas de amor aguçaram suas memórias e eles perceberam que diante deles estava o Amado e Bendito Salvador.
Precisamos diariamente trazer a nossa memória as verdades eternas do evangelho. O Filho de Deus morreu na cruz não para provar nosso valor, mas para demonstrar o tratamento severo que Deus tem com o pecado. A minha e sua depravação custaram todo o sangue de Cristo na cruz. Para reunir o seu povo, aqueles que Ele escolheu para serem dEle antes da fundação do mundo, Deus enviou seu filho para morrer por nós, pecadores indignos, para nos tornar seus herdeiros e coherdeiros com Cristo. Imaginar que Cristo sofreu a ira que pertencia a mim e creditou em mim Sua justiça deve me inspirar a seguir em frente, levando dia após dia minha cruz, me arrependendo dos meus pecados e crendo nele para minha salvação.
E aconteceu que, quando estavam à mesa, ele pegou o pão e o abençoou; depois, partiu o pão e o deu a eles. Então os olhos deles se abriram, e eles reconheceram Jesus; mas ele desapareceu da presença deles. Lucas 24:30,31
Conclusão
Que Deus, por sua graça, avive nosso coração e nossa esperança, para seguirmos diante dele com coragem e ousadia, cumprindo nossa vocação e não permitindo que o desânimo venha ocupar em nós o lugar que pertence a Cristo. Que o sofrimento do Salvador para nos resgatar nos encoraje a perseguirmos dia após dia o objetivo de glorificarmos a Deus e sermos achados irrepreensíveis na ocasião da sua vinda.
Que Ele te abençoe!

Pastor Sérgio Fernandes
Pastor Titular da IPR